quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

quando o diabo ama.

Encarou o cabra com a alma sangrando, sua raiva afiava a peixeira, mas não precisaria de lamina, suas palavras metralharam tudo. Era o macho indo ter com aquele que roubara-lhe a fêmea, ou fora ela quem permitiu-se perder? Já não mais importava.
Já tinha vivido um pouco de tudo na vida, quiçá viera ter no mundo a função de cobaia, vai ver que foi deus que testara o corpo do pobre pra ver ate onde o cabra macho agüenta.
E ele agüentava. Era só carne, osso e desafio, era feito disso.
Sobreviveu, talvez por promessa de antepassados, que também não tiveram melhor sorte e  deixaram-no sozinho, com cheiro de morte, mas o danado vingou.
Mas lá foi ele, matou algumas vezes e morreu tantas outras, e sempre acordava acreditando que o sol que lhe dava sede era o mesmo que norteava o caminho.
E, num desses caminhos, vem aquele que ate então não conhecia, nem nunca tinha ouvido falar. Vem aquele que lhe deixa sem sono e é muito maior que o deserto. Por vezes vazio, mas de um vazio tão grande que o preenchia. O cabra não entendia nada. Era só aquela maldita sensação de felicidade que culminava depois em solidão, porque nunca se contentava. Era aquela incapacidade de soletrar o sentimento, de esvaziar de novo o coração e viver somente pra si. Não conseguira.
Num desses caminhos encontrou a praga que o levou ao desespero mais do que toda a fome ou desgraça que tenha lhe sucumbido a vida e, que se ate hoje tais desgraças lhe preservaram o pulso foi somente por uma questão de crença “cabra macho não se mata”, mas fora difícil agüentar ate aqui.
E um filme passara-lhe pela cabeça, só viu miséria e cactos e o pior deles era esse que lhe arranhava a alma. Esse que veio através do cabelo negro e corpo magro, da pele morena e um olhar que lhe desnudava. Esse desejo trazido por ela e que por causa dele, pela primeira vez, o cabra viu-se sozinho, mesmo tendo passado a vida toda só. Agora era solidão da falta. E o cabra chorou.
Chorou alto, gritou desesperadamente àquele que a levara embora, apontando-lhe o dedo na cara: “...e se um dia tu fizer ela chorar e nem se quer carregar a lagrima dela com cuidado pra modo de não deixar a maldita lagrima cair no chão e fazer nascer tristeza, eu juro que vou atrás de tu e lhe arranco a vida e ... trago a minha de volta...”

E saiu no galope o cabra macho, e ate hoje ele chora.




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